Uma análise recente sobre os conflitos por terra na Amazônia Legal revelou um cenário de transformações marcantes no primeiro semestre de 2023. Embora tenha havido uma notável queda de 25,7% nos conflitos na região, a nível nacional, a situação é preocupante, com um aumento de 9,1%.
Segundo dados coletados pelo Cedoc (Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno) e divulgados pela CPT (Comissão Pastoral da Terra), a Amazônia Legal, que abrange estados como Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, testemunhou uma redução notável nos conflitos por terra, marcando um total de 329 ocorrências no primeiro semestre de 2023.
Entretanto, o país como um todo experimentou um aumento de 9,1%, totalizando 791 ocorrências no mesmo período, o segundo maior número da década, atrás apenas de 2020, com 876 casos.
A análise aponta que os principais afetados pela violência relacionada à terra em 2023 foram os povos indígenas, com 38,2% dos casos, seguidos pelos trabalhadores rurais sem terra (19,2%), posseiros (14,1%) e quilombolas (12,2%). Além dos conflitos de terra, a CPT também documentou ocorrências de trabalho escravo e conflitos pela água, totalizando 973 conflitos no campo, um aumento de 8,1% em relação ao ano anterior e envolvendo cerca de 527 mil pessoas.
No que diz respeito ao trabalho escravo, houve um aumento notável tanto no número de registros (20%) quanto no número de pessoas resgatadas (43,9%), totalizando 102 ocorrências e 1.408 trabalhadores resgatados. Essa é a maior quantidade de resgates desde 2014, sugerindo uma crescente visibilidade dada a essas formas de violência.
O agronegócio representou a atividade com o maior número de pessoas resgatadas, incluindo 532 no cultivo de cana-de-açúcar, 331 em lavouras permanentes e 46 na pecuária. Além disso, houve resgates em atividades de mineração (104), desmatamento (63) e produção de carvão vegetal (51).
As reduções nos conflitos na região amazônica nos primeiros meses do governo do presidente Lula (PT) coincidiram com uma diminuição significativa dos alertas de desmatamento na Amazônia, que caíram 33,6% durante o mesmo período. O Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática também relatou um aumento notável nas ações de fiscalização de crimes ambientais, incluindo multas (166%), embargos (111%) e termos de destruição de equipamentos usados em crimes ambientais (260%).
No entanto, Ronilson Costa, um dos coordenadores nacionais da CPT, alertou que, apesar da queda nos conflitos na Amazônia, a situação continua crítica. “O mundo inteiro está com os olhos voltados para a Amazônia, o que é uma pressão importante. Mas, no dia a dia dos povos ribeirinhos e indígenas, ainda há muitas situações de pressão e violência”, afirmou.
Costa enfatizou que, embora o número de conflitos tenha diminuído na região, o número de pessoas afetadas aumentou, atingindo o patamar mais alto dos últimos dez anos. Ele também apontou para o aumento nos conflitos por terra em outras regiões do país, como Mato Grosso do Sul (72% de aumento) e Goiás (258% de aumento).
Ele atribuiu o aumento dos conflitos à expansão do agronegócio e da exploração mineral, que frequentemente avançam sobre territórios já ocupados, como áreas de agricultura familiar e terras indígenas e quilombolas. A lentidão na resolução de processos judiciais relacionados a terras disputadas também foi citada como um fator que intensifica os conflitos.
Costa destacou ainda que o governo anterior desmantelou políticas públicas destinadas a estabilizar e garantir segurança a essas comunidades. “Foram anos de muita invasão de terras indígenas e quilombolas por parte de fazendeiros e de grileiros”, concluiu.
Em agosto, o presidente Lula assinou decretos para retomar o Programa Nacional de Reforma Agrária, indicando um desejo de promover mudanças significativas na situação de conflito no campo.